Faz anos que saí da Polônia, mas
me lembro de muito bem daquele out de 1982: Mamãe me mandou guardar um lugar na
fila da loja de roupas. Vovó já está em outra, com meu irmão pequeno, enquanto
ela vai para a da Padaria. Papai ainda não chegou com a lista. Todo mês um
homem - eu achava que tinha um chapéu muito engraçado, mas hoje sei que era um
quepe - dava para o papai uma lista do que comprar. Quase nunca ele ficava
feliz e sempre suspirava: “Não vai dar, de novo!” Estava tão ansiosa que dizia
para todos na fila: “Espero que ele não demore. Hoje vou comprar meu presente
de aniversário”. Meus olhos brilharam quando Papai chegou. Ele pede licença
para o pessoal da fila até chegar em mim e se ajoelha: “Desculpe, minha
lindinha, mas dessa vez não vai dar para comprar seu vestido. Não me autorizam
a comprar roupas. Nem sua cama nova. Vamos sair daqui e ir para a fila da
Mercearia. Lá você pode pegar uma escova de dente e outra coisa que você
quiser, tudo bem?”. Com lágrimas nos olhos, vamos os dois para a fila da
Mercearia, que não abriu naquele dia, nem no seguinte, nem no outro. Só na
terça da semana seguinte. Feliz aniversário para mim! Kolejka Tá na Mesa!
Kolejka é um jogo criado em 2011
por Karol Madaj. De dois a cindo jogadores, com duração média de 60 minutos, em
Kolejka os jogadores devem enfrentar longas filas para poderem comprar produtos
que estão em sua lista.
- Mais um jogo que incentiva o
capitalismo e o consumismo. Golpistas não passarão!
Ao contrário, Towarzyszu. Kolejka (Nota da Sra. Slovic: Que
significa Fila em polonês. Leia-se: coleica) é um jogo que retrata o dia a dia
da população da Polônia em meio ao regime Comunista, enquanto o pais ainda
estava atrás da Cortina de Ferro (Nota do Sr. Slovic: Expressão usada para
designar a divisão dos países na Europa. Os que estavam atrás da cortina
estavam sob influência da União Soviética), quando os recursos eram escaços e o
governo controlava toda a economia. O objetivo do jogo é bem simples, conseguir
comprar todos os produtos de sua lista de comprar. O problema é que todos
querem fazer o mesmo e não há para todos.
O Tabuleiro Central representa um típico local de comércio, com cinco lojas
(Roupas, Móveis, Eletrodomésticos, Artigos do Lar e Alimentos), cada uma com uma
fila. No início do turno, os jogadores posicionam seus familiares nas filas que
sejam mais interessantes. Até ai sem nenhuma complicação, porém somente algumas
lojas abrem por rodada e só poucos produtos cada. Nunca com o suficiente para todos.
E só descobrimos quais lojas tem produtos depois de colocar os peões. Cada
rodada representa um dia.
- Que jogo injusto! Como assim não tem para todos? Isso é mentira!
Então, caro Komunistyczny, tem visto a TV
ultimamente? Isso acontece atualmente na Venezuela. Aconteceu em países como
Polônia, Albânia, Hungria (Nota do Sr. Slovic: Todos membros do Pacto de
Varsóvia). Aconteceu também na Alemanha Nazista. Isso é típico de governos
autoritários, que controlam totalmente e economia e o mercado, independente se
é de Direita, Centro ou Esquerda. O governo decide o que a população precisa,
por isso há as Cartas de Produtos, que determinam o tipo de loja que receberá
produtos (de um a três) e a quantidade (de um a quatro).
Depois de determinar quais lojas terão produtos, cada jogador compra três Cartas
de Filas, que dão habilidades especiais. O jogador só pode jogar uma por vez e,
quando usada, fica na pilha de descarte até a semana terminar (Nota da Sra.
Slovic: Ou seja, até o fim da quinta rodada). Há a carta que deixa o peão ficar
no início da fila (Estou com criança pequena), outra que deixa ver as lojas que
vão abrir no dia seguinte (Amigo no Comitê), outra que inverte a fila (Lista Corporativa) e uma que muda u produto de uma loja para outra (Entrega errada). Cada
pode usar até 10 cartas por semana. Se não quiser usar mais nenhuma da mão,
pode devolve-las ao seu maço, mas passa a vez e não joga mais nenhuma carta
nessa rodada. As cartas servem basicamente para manipular a fila, deixando seus
familiares mais próximos da loja, ou seus adversários mais longe.
- Não gostei do jogo. Subverte tudo em que acredito.
Nic nie wiesz, niewinny. Kolejka é um jogo onde o mais esperto
consegue comprar o que precisa para sobreviver. A vida não é fácil ou justa
entre os vão da calçada. Assim que todos passarem, as lojas abrem e cada peão
pode comprar uma mercadoria (Nota da Sra. Slovic: Não há dinheiro no jogo,
então o jogador só pega uma carta de produto). Acabando os produtos, ninguém
pega mais nada e a fila continua para o próximo dia. Em cada fila sempre há um
peão preto, o Atravessador. No início do jogo ele entra no fim das filas e
quando ele consegue comprar algo, esse produto vai para o Mercado Paralelo.
Depois que as lojas fecham, o Mercado Paralelo abre (Nota do Sr. Slovic:
Sim, lógico que para nele também há uma fila). Os jogadores podem trocar
mercadorias no preço de 2:1, exceto a do dia, onde a taxa é 1:1 (Dica da Sra.
Slovic: Cada dia um tipo de mercadoria está com a taxa vantajosa. Saiba usar
bem o mercado). Com o fechamento do Mercado Paralelo, termina o turno e um novo
dia começa. O jogo termina quando alguém consegue comprar todos os itens de sua
lista ou quando todos os produtos acabam.
O jogo tem uma expansão: Ogonek (Nota da Sra. Slovic: Dificil de traduzir.
Algo relacionado a fim da fila). Primeiro ela trás componentes para um sexto
jogador (Dica do Sr. Slovic: Achava que com cinco já era algo caótico? Você não
sabe de nada, Jon Snow!). Depois adiciona mais quatro cartas de fila, sendo que
uma até tira produtos das lojas! E duas novidades: as cartas de Trybuna Ludo
(Nota da Sra. Slovic: Algo como Gazeta do Povo): Notícias de jornal que entram
antes da abertura das lojas e modificam (e muito) as regras da rodada. E as
cartas de Bebida, que são compradas em uma loja extra (Sim, tem fila), que abre
depois que as outras fecham, antes do Mercado Paralelo. Essas cartas tem duas
funções: você pode dar para um Atravessador, fazendo que ele vá para o fim da fila
ou como mercadoria de troca no Mercado Paralelo. A Vodca não conta como
mercadoria no fim de jogo.
No geral, Kolejka é um jogo muito legal (Nota do Casal Slovic: Realmente
valeu apena esperar tanto tempo para entrar de vez na nossa coleção). O jogo é
realístico e brutal. Um verdadeiro soco na barriga nos mais idealistas .Koleija,
acima de tudo, é uma cítica velada ao comunismo, e antes que alguém diga que
isso é propaganda anti comunista americana, saiba que o autor é polonês e viveu nesse período. Ele
sabe do que está falando. Não é um jogo que vai agradar a todos, principalmente
quem não gosta de sacanear (ou ser sacaneado por) amiguinhos. As Cartas de
filas são injustas, mas como todos tem as mesma cartas, com certeza se você não
usar contra alguém, usarão contra você. A arte é um tanto feia (Nota da Sra.
Slovic: Na verdade ele é tosca), mas remete a dureza que o jogo quer mostrar. O
manual de regras parece uma daqueles livros de instruções antigos, com manchas
de café. As mercadorias são todos produtos típicos da Polônia da década de
1980 e estão em polonês, para entrar no clima. O jogo é divertido e um tanto
até didático. Vale a pena pelo menos conhecer. Wszystkiego najlepszego, pani Slovic!
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